Experiências revelam a necessidade de uma mobilização nacional contra crime organizado, a necessária interação entre órgãos públicos
Atualmente a atividade criminosa, em termos de organização administrativa interna, técnicas de expansão e lucratividade, assumiu feições até então apenas imaginadas e aplicáveis em grandes empresas. Antigamente, os órgãos públicos responsáveis pelo efetivo combate à atividade criminosa trabalhavam com indivíduos de certa forma facilmente identificáveis e que agiam de forma isolada ou em bandos ou quadrilhas com permanência apenas enquanto duravam os interesses próprios. Hoje, vivenciamos associações permanentes, com propósitos duradouros, forte hierarquia e cujos integrantes chegam a se esconder sob o manto da aparente suspeição.
No intuito de levar à Sociedade e aos profissionais do Direito reflexões sobre esses grupos criminosos organizados, a Justiça Federal no Ceará – JFCE promoveu nesses dias 13 e 14 de setembro de 2012 seminário que falou sobre o Combate ao Crime Organizado. Iniciativa da ESMAFE, Núcleo Seccional do Ceará, os painéis trouxeram à JFCE nomes expressivos do Direito Penal, além de experiências do dia a dia, vivenciadas por magistrados, membros do Ministério Público Federal e Polícia Federal.
A experiência antimáfia na Itália
Logo na primeira palestra do Seminário, os participantes foram conduzidos a momentos fortes de reflexão, em vista à praticidade do tema escolhido para estréia dos painéis. Coube ao Diretor do Foro da JFCE, Juiz Federal Leonardo Resende Martins, dissecar a estrutura da máfia italiana. Organização criminosa complexa, a atividade criminosa multifacetada da máfia, sobretudo os crimes cometidos contra a administração pública, levou os participantes a correlacionar a situação vivida na Itália com a experiência brasileira.
“Não temos o direito de sermos ingênuos.”
O Juiz Federal Danilo Fontenelle, em palestra proferida no encontro, com o tema Novos Aspectos da Lei de Lavagem, fez alerta aos participantes do Seminário sobre a complexidade das organizações criminosas no Brasil. Para o Magistrado, que é titular de Vara especializada em crimes contra o sistema financeiro e lavagem de dinheiro, não é possível tratar num mesmo plano o criminoso de uma organização e um delinqüente que furta.
“Não temos o direito de sermos ingênuos. Talvez, no passado, fomos ingênuos”. A frase do Juiz Federal Danilo Fontenelle buscou delinear a nova imagem do crime organizado no Brasil. Vivemos uma cultura de “delírios de imagem”, segundo o Magistrado, onde a cultura popular cria uma “imagem positiva” do bandido, do criminoso”. Indagou aos participantes: “Vamos evoluir às custas de perdas de agentes públicos? Quantos assassinatos de agentes públicos deverão ocorrer, para tirar-nos dessa inércia? E conclui enfático: “Temos que promover uma mobilização social. Não bastam leis, mas participação ativa de outros órgãos públicos.”
Ao contemplar a assembléia que assistia atenta às informações e alertas oriundos do tema em comento, o Magistrado Federal fez especial exortação aos estudantes participantes do Seminário, para assumirem total consciência e responsabilidade sobre o tema. Esse o papel dos novos profissionais do Direito.
Aliás, quando da abertura do Seminário, o Juiz Federal Danilo Fontenelle foi enfático ao dizer que todo o evento seria realizado com total transparência e responsabilidade. Fato que atribuiu ao encontro um caráter singular pelo apelo único ao que iria ser informado, ao mesmo tempo plural, pelas fortes experiências vivenciadas por todos os palestrantes.
Relação Institucional e desburocratização – uma realidade sempre necessária
Para o Juiz Federal Marcelo Granado – JFRJ, o enfrentamento ao crime organizado se dá a partir da integração institucional, segundo o Magistrado, extremamente necessária: “O dia-a-dia do Judiciário no combate ao crime organizado acontece graças a essa integração Ministério Público, Polícia Federal e Judiciário”. “Todos estamos no mesmo barco. O foco é o mesmo”, desabafou o Magistrado carioca, ao falar sobre “Técnicas especiais de investigação – Medidas assecuratórias e entrega controlada (4º painel do encontro).
Ainda, para o Juiz Federal Marcelo Granado, com larga experiência no combate ao crime organizado em nosso País, a experiência por que passa o juiz de primeiro grau é muito importante. A relação que se estabelece numa audiência, a interação que se dá entre Magistrado, Ministério Público, Autoridade Policial, Defensoria, “de ouvir… do olho no olho… de sentir a expressividade dos componentes”, é uma experiência muito importante. Todo julgador deveria passar por essa experiência.
Furto ao Banco Central – Investigações continuam
135 presos, 85 condenados. Desses, 33 são partícipes diretos, estando 29 presos, dois foragidos e dois mortos. Cerca de 60 milhões de reais recuperados. As informações trazidas pelo Delegado Federal
Antônio Celso do Santos surpreendeu os participantes do Seminário.
Em sua palestra, o Delegado Celso mostrou a complexidade dos relacionamentos dos envolvidos no furto ao Banco Central, que levaram 164 milhões de reais, numa investida audaciosa. Para o delegado federal, em cinco anos de investigação ficou demonstrada a participação de uma das mais complexas redes criminosas do Brasil, o PCC – Primeiro Comando da Capital.
Mais uma vez, em sua exposição, o delegado Celso ratificou a tônica do Seminário, quando demonstrou a necessária interação e desburocratização do sistema Judiciário, no sentido de possibilitar ações rápidas na captura de envolvidos e apreensão de bens. Na oportunidade, o Delegado Federal enalteceu as ações da 11ª Vara Federal da JFCE, no cumprimento das solicitações da Polícia Federal: “Tivemos uma resposta muito positiva das JFCE, que atendia às solicitações da Polícia Federal, com rapidez, agilidade, que culminou com o sucesso da operação.”
Outros importantes painéis foram apresentados durante o Seminário e que destacaram as ações do Ministério Público no Estado do Ceará bem assim de Secretarias do Governo do Estado no combate ao tráfico de pessoas e órgãos. A participação da Procuradora da República (MPFCE) e Procuradora Regional dos Direitos do Cidadão, Nilce Cunha, do Secretário de Turismo do Estado do Ceará, Bismarck Maia, da Advogada Lívia Xerez, Coordenadora do Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, da Secretaria de Justiça do Estado do Ceará, e da Senhora Rosarina Sampaio, presidente da Associação das Prostitutas do Ceará, definiram as ações de combate a essa prática no Estado do Ceará, sobretudo à prevenção porquanto a Copa de 2014.
Participantes:
Ponto de destaque nesse Seminário foi a efetiva interação de todos os participantes. Os questionamentos levantados conduziram os palestrantes a momentos de excepcional reflexão em torno dos assuntos que eram dispostos em cada painel.