Reintegrar na posse do imóvel localizado na rua General Bezerril, nº 670, Centro de Fortaleza, o Instituto Nacional do Seguro Social, com ordem de arrombamento, se necessário for, bem como a efetiva utilização de força policial, usando os meios e stritamente necessários e suficientes para que, com a moderação recomendável em tai s situações, façam eficaz a ordem de reintegração, determinava o mandado de reintegr ação na posse, oriundo da 4ª Vara Federal. Era sexta-feira, 31 de março de 2006.
Em verdade, um grupo de aproximadamente 100 (cem) famílias, pertencente ao Movimento de Luta dos Bairros, Vilas e Favelas – MLB desafiou a segurança do trintenário prédio do Instituto e invadiu suas dependências, na segunda-feira, 27 de março de 2006, uma vez que há muito tempo estavam parcialmente desocupadas. A ofensiva foi parte de um movimento que deverá realizar uma jornada de ocupação de terrenos e prédios públicos “para que o Governo mude a política econômica”, segundo informações colhidas pelos oficiais de justiça federais.
Mandado de Intimação nas mãos, datado de 28 de março de 2006, partiram os oficiais de justiça federais para o local da invasão. Paulo Sérgio, Márcia Lima, José Emílio e Ana Gláubia, sem temer as ameaças e intimidações feitas pelos ocupantes, em diligência contínua, levaram a termo a leitura de todo o teor daquele mandado, seguida da íntegra do Despacho liminar do juiz federal da 4ª Vara, José Vidal Silva Neto. Foram momentos de muita expectativa, uma vez que os ânimos pelo local não estavam tão pacificados. “No caso de tentativa de desocupação, a praça defronte o prédio se transformará numa praça de guerra, vamos utilizar os equipamentos e móveis do prédio para fazer barricadas”, diziam alguns membros do movimento.
No mandado de intimação o prazo de 48 (quarenta e oito) horas, que findaria na sexta feira, 31 de março de 2006, às 12h45, com a desocupação espontânea e pacífica dos ocupantes. Desocupação efetivada no horário previsto? Não! Os oficiais federais retornaram ao endereço da ocupação por volta das 12h50 e nenhuma providência de desocupação havia sido adotada. Restaria agora o mandado de reintegração na posse, com ordem de arrombamento, se necessário, bem como a efetiva utilização da polícia (federal e militar).
Os primeiros momentos que decorreram do prazo final fixado foram de extrema delicadeza. De repente, no silêncio daquela tarde de sexta-feira, 31 de março, entrecortado por buzinas de carros em trânsito e pessoas que conversavam preguiçosamente nos banco da praça defronte ao prédio ocupado, ouviram-se as sirenes de veículos que anunciavam na boca do povo: “lá vem a polícia!”. E ela veio mesmo. Só que viaturas da polícia federal, em número expressivo. Gritos eram ouvidos de toda a parte da praça que logo foi sendo tomada pelos curiosos. Nas janelas do prédio ocupado, adultos e crianças aguardavam indefinidas ações em silêncio.
De repente, as janelas do prédio em ocupação foram fechadas. As viaturas federais foram estacionando e os policiais a se espalharem por toda a rua General Bezerril, precisamente no quarteirão onde se localiza o prédio então ocupado. Isolamentos necessários feitos pela polícia federal, começou uma via crucificada de negociações. Agentes federais procuravam a todo custo evitar um confronto com os ocupantes do prédio. De repente, o inevitável. Membros líderes do movimento, que estavam do lado de fora do prédio, entraram em discussão com alguns agentes federais, que revidaram, detendo esses líderes, o que provocou uma algazarra defronte ao prédio ocupado.
A busca pelo diálogo mesmo assim continuou, agora com a presença da comissão de direitos humanos da Assembléia Legislativa de Fortaleza e da Ordem dos Advogados do Brasil. Eram momentos de intensa conversação e de intenso movimento no quarteirão, tomado por curiosos. Membros da comissão de direitos humanos procuravam liberar os líderes detidos; delegados federais, por sua vez, buscavam convencer os ocupantes a saírem do prédio. Os oficiais de justiça federais, agora em número maior (Paulo, Gláubia, Sólon, Luciano, Emílio, Roberto Maurício, Márcia Neves, Raquel Torquato) acompanhavam com serenidade e paciência de um monge o cumprimento do mandado expedido pelo juiz federal.
Já para o final da tarde, por volta das 18h, os líderes do movimento que haviam sido detidos foram liberados e, a partir desse momento, começou uma rodada de negociações. Membros da Comissão de direitos humanos da OAB-CE, da Assembléia Legislativa do Ceará (deputada estadual íris Tavares), delegados federais, oficiais de justiça federais, secretário da defesa civil de Fortaleza, servidores ligados à Habitafor, da Prefeitura Municipal de Fortaleza, gerentes estaduais do INSS, membros da central de movimentos populares e os integrantes-líderes do movimento (MLB). Tinha início um momento histórico no dever de cumprimento de uma ordem judicial, onde se buscava a realização de um bem comum e que afastasse a imagem cruel da violência.
As negociações continuaram noite adentro, sem que as partes oferecessem alternativas concretas para a desocupação do prédio do INSS. De um lado, a secretaria de defesa civil do Município não apresentava uma proposta de albergue das famílias que ocupavam o prédio. “Não há locais públicos para receber essas famílias!”, exclamava o secretário da defesa civil, Arimar Rocha. Oferecia, no entanto, assistência alimentícia, médica e lonas para construções temporárias de moradia. A dirigente da Habitafor, Olinda Maria dos Santos, sugeria um cadastramento das famílias, para posterior habitação em áreas a serem determinadas.
Negociações, pausas, negociações, pausas. Parece que o cansaço e a exaustão de argumentos, oriundos de todas as partes em direção aos integrantes do movimento e destes para as comissões ali formadas, gerou ao final uma saída: os integrantes líderes do movimento propuseram a saída das famílias, mediante um processo de cadastramento, a ser realizado pela Habitafor, desde que a cada três horas, a partir daquela noite de sexta-feira, 31 de março, fosse cadastrada uma família. Com o cadastramento, noite adentro fim de semana seguido, sairiam as 16 primeiras famílias, prolongando-se o cadastramento durante a semana.
Proposta aceita! Nos delegados federais Renam Rocha Ribeiro, Wagner e Hider, que estavam à mesa de negociações, transpirava uma paciência e tolerância singulares, próprias daqueles que sabem as conseqüências danosas de uma ação policial nos limites determinados. Foram vitoriosos no desfecho das negociações juntamente com seus agentes federais. Na tranqüilidade dos oficiais de justiça que a tudo presenciaram com austeridade de olhares, que cobravam respostas concretas, com a serenidade de semblantes confiantes no rumo das negociações empreendidas e com a postura de servidores na busca do cumprimento de um mandado judicial, finalmente, ouviu-se a frase tão esperada: “o mandado foi cumprido!”
Aquelas pessoas humildes, suas lideranças, famílias, deixavam a partir de então de ocupar o prédio do INSS, também vitoriosos, pois todo o prédio do Instituto será objeto de estudos pela Caixa Econômica Federal, para fins de viabilizar sua área para moradias. O cadastramento dessas famílias já começaria naquela noite. Cumpria-se, assim, qual profecia, a determinação do juiz federal José Vidal Silva Neto “que todos desocupem espontânea e pacificamente o imóvel ilegitimamente ocupado. Assim, Justiça e Cidadão dialogaram!”
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{galeria_legenda}0|inss902.jpg|Integrantes do movimento perante o cordão isolador{/galeria_legenda}
{galeria_legenda}0|inss904.jpg|Prédio do INSS ocupado {/galeria_legenda}
{galeria_legenda}0|inss906.jpg|Momentos de negociação{/galeria_legenda}
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{galeria_legenda}0|inss917.jpg|Integrantes – líderes do movimento{/galeria_legenda}
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{galeria_legenda}0|inssFoto1.jpg|Momento em que um dos líderes recebia o mandado de intimação{/galeria_legenda}