Magistrado conciliou solução do conflito in loco e ordenou que as partes tenham pleno acesso às suas residências
O juiz federal titular da 3ª Vara Federal, George Marmelstein Lima, realizou inspeção judicial na Comunidade Quilombola “Boqueirão da Arara”, em Caucaia, no último dia 23/1. O objetivo da visita foi observar o cumprimento da decisão do processo de nº 0002623-88.2012.4.05.8100. Segundo os quilombolas, os proprietários da fazenda Boqueirão estão impedindo o acesso pleno deles e de seus familiares ao local indicado nos autos, inviabilizando a entrada de veículos particulares ou de serviços no lado norte da propriedade, descumprindo ordem judicial proferida em 2014.
Durante a inspeção, o magistrado definiu a melhor forma de cumprimento da decisão judicial, ouvindo o representante da Associação dos Remanescentes de Quilombos da Comunidade Povoado Boqueirão da Arara (ARQCPBA), Madalena Barbosa Prata, os moradores da área e o advogado da parte ré, Daniel Teófilo. Estiveram presentes o antropólogo do Incra/CE, José da Guia Marques, e o procurador federal Leonardo Lima Nunes.
Conflito e demarcação
A Comunidade Quilombola “Boqueirão da Arara” é objeto de demarcação de terras do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – Incra. A área de 718,5 hectares abriga 89 famílias, em dois lados da margem da BR 222, no quilômetro 26, em Caucaia. O espaço em questão abriga três famílias que, segundo relatos, estão sendo impossibilitadas de receber serviços como carros pipa ou de ligação de energia elétrica e até visitas dos familiares, pela dificuldade de acesso dos veículos através de um portão constantemente trancado, o qual eles não possuem as chaves. Os moradores alegam que ainda estão sendo intimidados por seguranças armados, que estariam proibindo a caça, a pesca e o uso dos recursos da região.
Em 2012, o Ministério Público Federal propôs Ação Civil Pública contra a proprietária de uma propriedade rural onde residem remanescentes de quilombolas em processo de auto-identificação. Segundo o relatório do MPF, no mês de março do referido ano, sete casas foram derrubadas por ordem da requerida, e as respectivas famílias expulsas da área. A ré, por intermédio de homens armados, teria ameaçado os moradores, a fim de que abandonem o local.
Na ACP, o MPF requereu que fosse ordenado à ré “que se abstenha de qualquer ato tendente a alterar os marcos demarcatórios da propriedade, bem como de praticar qualquer ato tendente a obstar ou dificultar o acesso dos moradores da comunidade às fontes de argua existentes na propriedade, ou a interferir de qualquer forma no cotidiano da comunidade Boqueirão da Arara, até definição da natureza jurídica da referida coletividade”.
A sentença, proferida em maio de 2014, julgou procedente os pedidos da ACP e concedeu a tutela inibitória nos termos do requerimento, com pagamento de multa caso fosse descumprida a ordem judicial.
Conciliação deu o tom da visita
Ao final da inspeção, o juiz federal dialogou com as partes e conciliou a solução, onde ficou acordado que a proprietária entregaria cópia das chaves do portão principal às famílias, a fim de que estas tenham pleno acesso aos seus domicílios. Também determinou a colocação de outro portão no acesso à casa sede, mantendo a convivência pacífica entre a proprietária e a comunidade.